sexta-feira, 14 de maio de 2010

Fungo acaba com um terço do ópio do Afeganistão e faz o preço disparar, beneficiando os taleban


Fonte: El Pais postado no UOL
Mariangela Paone
Em Madri
Mulheres trabalham em lavoura de papoula durante o período de colheita no Afeganistão

A destruição das colheitas de papoulas causada por um fungo nas últimas semanas está acabando com um terço da produção de ópio do Afeganistão, fazendo disparar os preços em benefício dos taleban, segundo informou ontem a Agência da ONU contra a Droga e o Crime (UNODC na sigla em inglês). "Em todo o país estimamos uma redução da produção de 25 a 30%, sobretudo no sul, onde se concentram as plantações", disse o diretor da agência, Antonio Mario Costa, em conversa por telefone de Nova York.

Na província de Helmand, onde em fevereiro as forças da Otan lideradas pelos EUA lançaram a maior ofensiva desde o início da guerra no Afeganistão em 2001, a redução das colheitas alcança 50%. Em Kandahar, outra peça chave da campanha militar afegã, a redução é calculada em 20%. Trata-se ao todo de cerca de 2 mil a 3 mil toneladas a menos, algo que, segundo Costa, não justifica o forte aumento do preço, de até 60%, que está sendo registrado.

"O Afeganistão continua produzindo uma quantidade de ópio superior à demanda global. Não há escassez. Mas falamos do preço aos agricultores, o chamado 'farm gate price', e esta é a reação dos que veem o próprio produto destruído em sua totalidade ou em parte", disse Costa.

Embora o corte da produção tenha sido um dos principais objetivos das forças internacionais no país, agora poderá se transformar em um novo elemento de risco. Por duas razões diferentes mas complementares no quadro da estratégia militar americana. A primeira é o efeito sobre o apoio da população local. "Entre os agricultores", explica Costa, "se difundiu a ideia de que a infecção não é natural, mas causada pela presença militar e o uso de agentes químicos." Uma hipótese que o diretor da UNODC descarta.

"Acreditamos que seja um fenômeno natural", diz, "mas se os agricultores perderem sua renda e continuarem acreditando que a difusão da infecção se deve à presença dos militares, isso se transformará em um risco estratégico. Poderiam ser tentados a se alistar nos taleban."

Uma infecção de ópio afetou as plantações de papoulas em 2005, mas atingiu sobretudo o norte do país, onde a produção é muito menos extensa que no sul. De fato, a maioria das províncias do norte está classificada pela ONU como "poppy free", sem plantações. As áreas de maior produção, lembra Costa, coincidem com as zonas que os taleban controlam ou nas quais têm influência. Nelas se concentram 90% da produção afegã, que por sua vez representa mais de 90% da produção mundial.

Daí vem o segundo motivo de preocupação para o sucesso da luta contra a insurgência. Embora não haja escassez, se o aumento do preço continuar - o preço hoje é de cerca de US$ 90 por quilo -, os taleban teriam a maior vantagem. "O aumento pode beneficiar os que têm estoques. Automaticamente haveria uma reavaliação de seu valor. Se os preços se mantiverem ou a infecção se estender para outras províncias, os taleban poderiam ser beneficiados porque têm grandes quantidades em suas mãos", comenta Costa.

O diretor da agência, no entanto, lembra que a destruição das colheitas é uma oportunidade: "Se a crise, bem-vinda como todas as reduções da produção, continuar, isto poderá se transformar em um fator positivo se forem oferecidos microcréditos e subsídios aos agricultores em troca do compromisso de não retomarem o cultivo".

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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